O deputado federal Kim Kataguiri (União-SP) apresentou, nesta quarta-feira, 4, um projeto de lei que modifica dispositivos do Marco Civil da Internet e do Código Civil com o objetivo de proteger a liberdade de expressão e disciplinar a atuação do Judiciário nas decisões que envolvam restrições ao uso da internet.
A proposta busca evitar o que o parlamentar classifica como “restrições desproporcionais” à manifestação de ideias nas redes sociais e proíbe, por exemplo, que decisões judiciais determinem a remoção de conteúdos de natureza política, filosófica, religiosa, opinativa, intelectual, artística ou de comunicação.
Segundo o projeto, “é vedado ao juiz a emissão de ordens que determinem a indisponibilização de conteúdo relacionado ao exercício da atividade parlamentar” e demais conteúdos que se enquadrem nesses campos.
O texto determina que as sanções contra provedores de conexão ou de aplicações de internet, como a suspensão ou proibição de funcionamento, só poderão ser aplicadas por decisão de órgão judicial colegiado, depois do esgotamento de medidas istrativas e judiciais, inclusive com requisição de cooperação jurídica internacional, no caso de empresas estrangeiras.
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O projeto de Kataguiri especifica que essas medidas serão permitidas apenas em situações de “descumprimento deliberado, reiterado e sistemático” de obrigações legais ou “risco concreto e comprovado à incolumidade pública ou à segurança nacional”.
Em nenhuma hipótese essas sanções poderão ser impostas de forma cautelar ou liminar, sem a existência de decisão judicial definitiva. Caso haja suspensão temporária ou proibição de atividades, a decisão deverá demonstrar “de maneira clara, objetiva e fundamentada os direitos fundamentais dos usuários violados, bem como as medidas corretivas a serem adotadas”.
O projeto também estabelece que qualquer decisão que determine a suspensão de contas de usuários deve ser precedida por provocação do Ministério Público. Além disso, essa suspensão será itida apenas como alternativa à prisão temporária ou preventiva, e quando houver justificativa legal e fática clara para a medida, por se tratar de uma “medida de caráter excepcional”.
Em casos considerados urgentes, como risco iminente à vida ou à segurança pública, a suspensão de contas poderá ser autorizada por decisão monocrática em caráter liminar. No entanto, tal decisão deverá ser submetida ao órgão colegiado competente em até cinco dias, sob pena de revogação automática.
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Projeto de Kataguiri impede suspensão de contas de políticos
O texto proíbe expressamente a suspensão de contas de detentores de mandatos eletivos, partidos políticos e candidatos, assim como de conteúdos que envolvam liberdade religiosa, convicções filosóficas e políticas, ou atividades científicas e de comunicação.
Outro ponto tratado é a limitação territorial das ordens judiciais. De acordo com a proposta, as decisões que determinem remoção de conteúdos ou suspensão de contas terão seus efeitos s ao território nacional.
A proposta também altera o Código Civil, ao isentar os provedores de internet de responsabilidade civil por atos ilícitos praticados por usuários, salvo em caso de ordem judicial específica, clara e fundamentada.
Na justificativa da proposta, o deputado afirma que o objetivo é “fortalecer a proteção à liberdade de expressão, ao devido processo legal e à segurança jurídica no uso da internet no Brasil”.

Kataguiri critica decisões judiciais que, segundo ele, “impõem restrições desproporcionais à liberdade de expressão, muitas vezes sem a devida fundamentação, contraditório ou observância do devido processo legal”.
O texto menciona episódios recentes de bloqueio de plataformas como X, Rumble e Truth Social, bem como a suspensão de contas de parlamentares, jornalistas e influenciadores, considerados pelo autor como exemplos de censura e abuso de autoridade.
“Tais medidas, frequentemente aplicadas de forma monocrática e com efeitos extraterritoriais, geram insegurança jurídica, comprometem a soberania nacional e afetam a confiança dos cidadãos nas instituições democráticas”, argumenta o parlamentar.
Ao final, o deputado convoca os demais parlamentares a aprovarem a proposta “com a urgência e a responsabilidade que o momento exige”, com o objetivo de restaurar “a confiança dos cidadãos nas instituições” e assegurar que “sua voz continuará livre e protegida sob a égide da Constituição”.
Projeto tramita em meio à ofensiva do STF sobre regras da internet
A tramitação do projeto ocorre em um momento decisivo para o futuro da regulação da internet no Brasil. Nesta quarta-feira, 4, o Supremo Tribunal Federal (STF) retomou o julgamento sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet, dispositivo que determina que plataformas digitais só podem ser responsabilizadas por conteúdos de terceiros mediante decisão judicial.
O caso, que pode redesenhar os limites da liberdade de expressão nas redes, reacende o debate sobre a separação de Poderes. Enquanto o Congresso Nacional discute propostas como a de Kataguiri, que reforçam garantias processuais e estabelecem limites à atuação judicial, o STF caminha em sentido oposto e abre espaço para medidas mais restritivas.
O presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, já declarou: “O STF esperou por muitos anos a aprovação de legislação pelo Congresso”, ao inferir que houve omissão por parte do Legislativo. “A lei não veio, mas nós temos casos para julgar.”

Ministros como Dias Toffoli e Luiz Fux defenderam a responsabilização das plataformas sem a exigência de ordem judicial em casos de desinformação ou discurso de ódio. Já André Mendonça, que deve votar nesta fase do julgamento, tende a sustentar a constitucionalidade do artigo 19 e reforçar a necessidade de decisão judicial para remoções.
A possível derrubada do dispositivo preocupa especialistas e representantes do setor. Segundo o presidente do Google Brasil, Fábio Coelho, o cenário pode levar as plataformas a adotarem censura preventiva e excluírem publicações por receio de sanções financeiras.
Essa exigência de atuação proativa, segundo críticos, comprometeria a pluralidade do debate público, especialmente diante da proximidade das eleições de 2026. A liberdade de expressão nas redes poderá ficar mais restrita do que em 2022, quando já se observou uma onda crescente de censura prévia.
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Se existir limitações à liberdade de expressão, nossas liberdades serão “comidas” paulatinamente pelas beradas. E cada uma será retirada posteriormente a outra. Quando dermos conta; já era!