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Edição 169

Uma fumaceira de incertezas

A ausência de segurança jurídica, acompanhada pela corrupção dos poderes públicos, pela distorção dos genuínos valores democráticos e pelo tolhimento da liberdade de expressão, entre outros fatos, são obstáculos à normalidade econômica

“E mais, se a trombeta só der sons confusos, quem se preparará para a batalha?”
São Paulo, 1 Coríntios 14:8

Nem só de pão vive o homem. Os problemas de uma sociedade transcendem muito os aspectos puramente econômicos. As atividades econômicas, por mais relevantes que sejam, são apenas um componente da vida em sociedade que, certamente, depende dos demais, assim como os influencia. O mundo não cabe inteiro em manuais de economia.

Os economistas, por uma questão de formação, costumam limitar suas análises a fatos econômicos, deixando de considerar os demais condicionantes. Se normalmente essa limitação já representa uma desatenção indevida, quando consideramos as condições políticas excepcionais que o Brasil está atravessando, deixa de ser uma simples distração para transformar-se em um enorme erro. 

As atividades — milhões e milhões de ações diárias — que caracterizam a economia real não se realizam em um vazio institucional, jurídico e político. Contrariamente, supõem um mínimo de segurança no que diz respeito às garantias da vida, da liberdade e da propriedade individuais, com o respeito absoluto às regras do jogo, vale dizer, além de amparo jurídico e representatividade do sistema político. E a principal tarefa do Estado é garantir essa segurança e a observância de requisitos verdadeiramente democráticos para que os cidadãos possam gozar dos frutos do próprio trabalho. E, portanto, sintam-se estimulados a buscar os seus fins com esforço e honestidade, sem a sensação de que essa busca é inútil e de que estão sendo permanentemente enganados. 

A ausência de segurança jurídica, acompanhada pela corrupção dos poderes públicos, pela distorção dos genuínos valores democráticos, pelo tolhimento da liberdade de expressão, pela contemporização com casos flagrantes de enriquecimento impróprio, entre outros fatos, são obstáculos à normalidade da ordem econômica. 

O processo de desenvolvimento econômico pode ser visualizado como uma torneira despejando investimentos em um reservatório. O crescimento da economia é motivado pelo fluxo de investimentos que, ao ingressarem no sistema econômico, aumentam o estoque de capital físico, humano e tecnológico, possibilitando a expansão da capacidade produtiva do país, da aptidão para gerar oferta. Crescimento autossustentado é um processo de acumulação generalizada de capital e não tem nada a ver com inchação da demanda no curto prazo, mas com o fortalecimento da oferta ao longo do tempo. 

O crescimento da economia é motivado pelo fluxo de investimentos que ingressam no sistema econômico | Foto: Shutterstock

A riqueza de um país ou região é construída por pessoas, pelas medidas práticas que tomam e pela utilização de recursos humanos, tendo como apoio qualidades morais, como esforço e mérito, instituições políticas que respeitam e incentivam a liberdade de escolha e leis. E que não sejam meros comandos ou ordens exarados por ditadores ou meia dúzia de poderosos, mas normas gerais de justa conduta, prospectivas, abstratas e impessoais e, portanto, aplicáveis a todos os habitantes, inclusive aos que eventualmente estiverem ocupando o poder. 

O processo de desenvolvimento, portanto, abrange dois tipos de influências: as que podemos chamar de “técnicas”, como o fluxo de investimentos contribuindo para aumentar o estoque de capital, o avanço tecnológico etc. E as que denominamos “ambientais”, a saber, a estabilidade institucional, a confiança e a segurança jurídica imprescindível para a tomada de decisões de longo prazo, que são as mais relevantes.

É, portanto, ingenuidade olhar apenas para o lado econômico das coisas. De que adianta ficar jogando conversa fora discutindo se a taxa Selic deve cair ou subir, quando o presidente do país estende um tapete vermelho para um ditador de quinta categoria como Maduro? Para que debater a alíquota de um imposto, se um deputado eleito com mais de 300 mil votos é sumariamente cassado em pouco mais de um minuto por um grupo reduzido de iluminados que não receberam sequer um voto? De que vale criticar o arcabouço do Haddad, se a Câmara “absorve” covardemente a cassação desse deputado, assim como “engoliu” no ado a de outro? De que serve analisar a economia como se tudo estivesse bem, como se o problema fosse apenas uma questão entre economistas de direita e esquerda, se Brasília vai sediar uma reunião do Foro de São Paulo, cuja composição e objetivos são de conhecimento geral">“O estouro anunciado da economia”

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10 comentários
  1. Alexandre Fonseca Costa
    Alexandre Fonseca Costa

    Muito agradeço pelo texto esclarecedor e realista!

  2. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    Artigo técnico e esclarecedor.
    Mas para o pessoal da esquerda que sonha em viver à custa dos contribuintes embora o estado não produza nada, acredita nos “benefícios dos sindicatos”, acolhe ditadores, etc, podemos escrever, falar, desenhar que eles continuarão com sua cabeça no final do século XIX ou início do século XX.

  3. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Todos esses dados econômicos não interessam a população, dados oficiais de um governo como esse, impossível de acreditar , e mais, entre os artigos apresentados pelos economistas são contraditórios

  4. Fraulein Zuschauer
    Fraulein Zuschauer

    Com as fenergias negativas massivamente direcionadas a ele do jeito que estão, Roberto Campos Neto tá sendo um verdadeiro herói.😉

  5. Fabio Reiff Biraghi
    Fabio Reiff Biraghi

    Muito bom texto. Retrata perfeitamente o que está se ando.

  6. MNJM
    MNJM

    Parabéns pelo texto.. Governo desqualificado, acolhendo ditadores, Judiciário ditatorial não respeitando a Constituição, Congresso omisso, insegurança total. Qual empresário investirá em um país com esse cenário? SÓ LOUCO.

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