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Ilustração: Shutterstock
Edição 258

A esquerda cai, a direita sobe

Jornal britânico The Telegraph fez as contas e mostra a decadência das políticas 'progressistas' nas urnas

Loriane Comeli
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A esquerda mundial vive seu pior momento em 30 anos. Esse declínio é simultâneo à ascensão das redes sociais e das ideias da direita conservadora. O jornal britânico The Telegraph analisou as últimas eleições em 73 democracias ao redor do mundo e constatou que partidos de esquerda obtiveram cerca de 45% dos votos nesses países. Enquanto isso, a direita bateu recorde de votos, com 51% de adesão. 

O maior triunfo recente da direita é a volta de Donald Trump à Casa Branca. No último domingo, 23, a Alemanha também deu uma guinada à direita, dando a vitória das eleições parlamentares a um partido de centro-direita e mais de 20% dos votos ao partido conservador Alternativa para a Alemanha (AfD) — que boa parte da imprensa chama de “extrema direita”.

Quando se observam apenas os resultados eleitorais nos Estados Unidos e em países da Europa Ocidental, a diferença é ainda maior: a direita obteve 56% dos votos, ante 42% da esquerda. Por trás dessa inversão está a percepção do fanatismo da esquerda, que deturpa ideias valorosas para usá-las em sua busca por manutenção em cargos políticos e aumento de poder.

Os colíderes da Alternativa para a Alemanha (AfD), Alice Weidel (ao centro) e Tino Chrupalla (segundo, da direita para a esquerda), posam com o líder do partido AfD no Bundestag, Bernd Baumann (terceiro, da esquerda para a direita), e o membro do partido AfD, Alexander Gauland (à esquerda), depois de darem uma declaração à imprensa no dia da reunião da fração parlamentar da AfD após as eleições gerais alemãs em Berlim, na Alemanha (25/2/2025) | Foto: Reuters/Lisi Niesner

“Todas as pautas da esquerda — diversidade, imigração, preservação do meio ambiente, igualdade —, na verdade, são pretextos para avançar um projeto de poder da esquerda”, , explica o diplomata brasileiro Gustavo Maultasch, autor do livro Contra Toda Censura. “O objetivo deles é usar essas pautas para acumular poder”.

Há várias eleições, os partidos de centro e de direita têm crescido na Europa justamente pela crítica que fazem às decisões “progressistas” da União Europeia. Essas decisões não têm sentido lógico ou, pior, causam danos aos cidadãos. Os europeus veem, por exemplo, o avanço constante das políticas migratórias ao mesmo tempo que observam o aumento da criminalidade advinda dos estrangeiros, especialmente contra mulheres. Observam também a islamização completa de algumas cidades ou regiões e a exacerbação dos gastos públicos com isso.

“Tratar bem o imigrante é uma ideia razoável, porém a pauta da esquerda não é a imigração”, explica Maultasch. “Há uma deturpação, de tratar o imigrante como se ele não tivesse nenhuma obrigação em relação ao país onde ele está e como se ele fosse inimputável e merecesse mais direitos do que um cidadão nascido no país. É uma radicalização fanática, como acontece em todas as outras pautas.”

Nas políticas ambientais, o caminho é o mesmo. Não se trata da defesa de cidades mais arborizadas, mas de impor regras, em nome de um “aquecimento global” não comprovado. O que encarece a vida do cidadão, inviabiliza e criminaliza atividades como o agronegócio e a exploração de combustíveis fósseis e, por fim, leva à escassez de alimentos e de energia.

Em setembro de 2022, na Itália, Giorgia Meloni foi eleita justamente por se posicionar radicalmente contra “os burocratas de Bruxelas” e as pautas como a “cultura da morte”, o “lobby LGBT” e a “ideologia de gênero”.

Desde então, países como Áustria, Finlândia e Irlanda também elegeram coalizões de direita ou centro-direita. A predominância das políticas conservadoras ficou evidente na eleição do Parlamento Europeu, em junho. O principal grupo de centro-direita, o Partido Popular Europeu, terminou em primeiro lugar, com número ainda maior de cadeiras. O crescimento da direita sa no Parlamento Europeu levou o presidente Emmanuel Macron a dissolver a Assembleia Nacional e a convocar novas eleições. Graças a alianças de última hora, o partido de Marine Le Pen, que a imprensa tradicional chama de “extrema direita”, não se sagrou vencedor.

Na Alemanha, quase um terço dos votos nas eleições para o Parlamento foi para a União Democrata-Cristã, partido de centro-direita de Friedrich Merz. Pouco mais 16 % foi para o Partido Social-Democrata, legenda de esquerda do atual chanceler federal, Olaf Scholz. Outro dado significativo são os quase 21% de votos obtidos pela AfD, partido de direita que Elon Musk, o principal defensor da liberdade de imprensa no mundo, chamou de “única salvação” da Alemanha.

Na América do Norte, o Canadá deve seguir os os do vizinho do sul e eleger o líder da direita Pierre Poilievre, apelidado de “Trump do Canadá”. A popularidade do primeiro-ministro esquerdista Justin Trudeau só caiu desde a pandemia, quando ele impôs medidas severas, como a obrigatoriedade de lockdowns e de vacinas experimentais. Na Europa, a esquerda conseguiu uma vitória significativa apenas no Reino Unido, onde o desgaste dos conservadores se acumulou ao longo de 14 anos de governo. O trabalhista Keir Starmer foi eleito primeiro-ministro. Menos de um ano depois, sua popularidade está em queda.

A primeira onda conservadora

Por volta de 2016, uma primeira onda conservadora no mundo se alinhou com a aprovação do referendo do Brexit e a efetiva saída do Reino Unido da União Europeia quatro anos depois. Em 2017, houve a eleição de Donald Trump para o primeiro mandato nos Estados Unidos e, no ano seguinte, Jair Bolsonaro foi eleito no Brasil. Maultasch observa que, em vez de fazer um mea culpa e tentar se adaptar aos anseios dos eleitores, que já clamavam pelo fim de pautas globalistas e identitárias, a esquerda dobrou a aposta. Radicalizou, avançando com bandeiras “antirracismo”, pela “igualdade de gênero” e da “ideologia de gênero”.

“Naquela primeira onda conservadora, a esquerda estava tão segura de si que cruzou todas as linhas do fanatismo, radicalizando todas as pautas”, explica o diplomata. “Então, as pessoas começaram a falar nas redes sociais, a observar que aquilo tudo era um absurdo, e viram que não estavam sozinhas. E aí começaram a formar uma massa crítica do outro lado também.”

Na América Latina

Na América Latina, a esquerda continua liderando o total de votos, mas seu declínio é visível nas últimas eleições, como mostra o levantamento do Telegraph. Os votos para partidos esquerdistas somaram quase 52%, o menor porcentual em mais de 30 anos.

O jornal cita as eleições de Santiago Peña no Paraguai e, de Daniel Noboa, no Equador, como representantes da direita na América Latina, ao lado do maior expoente, Javier Milei, que cada vez mais se coloca como aliado de Donald Trump. “O domínio da esquerda sobre a política latino-americana desde o final dos anos 2000 enfraqueceu depois das vitórias de líderes como o argentino Javier Milei”, afirma o jornal britânico.

Sobre o Brasil, o jornal destaca que o ex-presidente Jair Bolsonaro — referido como o “Trump dos Trópicos” — perdeu as eleições em 2022, “mas seu partido continua sendo o maior no Parlamento brasileiro”.

Para Christopher Sabatini, pesquisador sênior do Programa América Latina, EUA e Américas, na Chatham House, os partidos de esquerda viram sua parcela de votos diminuir como resultado da “inépcia governamental, promessas exageradas e corrupção”. “Nas últimas duas décadas, as preocupações dos eleitores com o crime e a violência dispararam… Essa é uma área em que a esquerda não conseguiu produzir muitos resultados ou uma resposta viável”, diz Sabatini ao Telegraph.

Christopher Sabatini, pesquisador sênior do Programa América Latina, EUA e Américas, na Chatham House | Foto: Reprodução redes sociais

África, Ásia e Europa Oriental

Os dados em outras regiões também são surpreendentes. Nos países da Europa Oriental, que formavam a antiga Cortina de Ferro, o declínio da esquerda se acentuou nos últimos anos e atingiu o pior resultado desde os anos 1990. Em média, os partidos esquerdistas da Albânia, Bulgária, Croácia, República Checa, Estônia, Hungria, Letônia, Lituânia, Moldávia, Montenegro, Macedônia do Norte, Polônia, Romênia, Sérvia, Eslováquia e Eslovênia obtiveram quase 40% dos votos nas últimas eleições, ante 50% de adesão às siglas de direita. No começo dos anos de 2010, a esquerda chegava a quase 55% e a direita tinha 45%.

Em Israel e em sete democracias da África, a esquerda, que tradicionalmente tinha o controle do eleitorado, registrou uma queda significativa de votos. Pela primeira vez, os partidos esquerdistas obtiveram menos de 55% dos votos. Até então, a esquerda acumulava porcentuais acima de 60% na região. O Telegraph considerou no levantamento até mesmo as chamadas “democracias imperfeitas”, onde nem todos os direitos civis são reconhecidos.

Na Austrália e na Ásia, onde tradicionalmente a direita tem vantagem eleitoral e obteve, nas últimas eleições, mais de 55% do eleitorado, a esquerda ficou com 45%. O levantamento do Telegraph considerou Timor Leste, Índia, Indonésia, Japão, Malásia, Mongólia, Nova Zelândia, Filipinas, Singapura, Coreia do Sul, Sri Lanka, Taiwan e Tailândia, além da Austrália.

Na Nova Zelândia, depois da renúncia de Jacinda Ardern, o líder do Partido Nacional, de centro-direita, Christopher Luxon, assumiu, levando o país a caminhos políticos menos progressistas. Jacinda ficou mundialmente conhecida por implantar um dos mais severos lockdowns durante a pandemia de covid-19 e por adotar políticas ambientais antiagricultura (como taxar os gases emitidos por bois e ovelhas).

Na Austrália, uma coalizão de direita saiu na frente nas pesquisas antes de uma eleição neste ano. Na Índia, a maior democracia do mundo, Narendra Modi e o Partido Bharatiya Janata (BJP), de direita, foram eleitos pela terceira vez em junho.

Donald Trump, presidente dos EUA, e Narendra Modi, primeiro-ministro indiano, durante coletiva de imprensa conjunta na Casa Branca, em Washington, D.C., EUA (13/2/2025) | Foto: Reuters/Kevin Lamarque

Mudança de longo prazo

Para o diplomata Gustavo Maultasch, essa segunda onda conservadora deve ser creditada, principalmente, à compra do Twitter por Elon Musk, que trava uma briga mundial — inclusive com a União Europeia — em defesa da liberdade de expressão. Desde que assumiu a plataforma, Musk expôs como funcionava a censura na rede social, especialmente durante a pandemia e para proteger democratas norte-americanos, com Joe Biden. No Brasil, os embates com o ministro Alexandre de Moraes, com a divulgação das ordens de censura a perfis conservadores, se acirraram em 2024.

“Sem o Elon Musk no Twitter, essa massa crítica de direita não iria se formar ou se manter”, acredita o diplomata. “Na Europa, por exemplo, tem um monte de gente sendo processada por palavras e um monte de bandido cometendo crime violento e não é investigado, julgado.” O que não é diferente no Brasil, onde centenas de pessoas já foram condenadas a penas superiores a 14 anos de prisão por atos de vandalismo, apenas circunstancialmente comprovados. Enquanto isso, líderes de facções criminosas obtêm toda sorte de benefícios processuais nas Cortes superiores, e réus confessos por corrupção têm anulados multas, processos e condenações.

Diante desse quadro, é difícil traçar um prognóstico, diz Maultasch. As verdadeiras mudanças am por depurações em instituições que lidam com a formação de opinião e de líderes políticos e empresariais. “Universidades, imprensa e instituições de peso mundial são controladas pelo pensamento ‘progressista’”, afirma. “Então, a mudança de longo prazo a necessariamente pela mudança cultural. É preciso esperar”.

Leia também “Por que a ONU está sempre do lado errado”

6 comentários
  1. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    Desde os anos 1960 a esquerda mundial dominava o ambiente político fantasiada de defensores disso, daquilo e daquele outro. e implantando principalmente no meio universitário seus ideais.
    Os conluios políticos proporcionavam troca de favores e cadeiras entre os diversos partidos e todos saiam ganhando, menos o eleitor.
    Com as redes sociais, que suplantou a imprensa oficial regiamente paga com recursos dos pagadores de impostos foi desmontada as maracutaias dos governos.
    “É preciso esperar”, mas esse caminho não tem mais volta.

  2. Jetro Araújo dos Santos
    Jetro Araújo dos Santos

    Não consigo ler todo conteúdo, algum problema?

  3. Ernando Nogueira Barros
    Ernando Nogueira Barros

    Não consigo ler a matéria completa

    1. Atendimento Oeste
      Atendimento Oeste

      Olá, boa tarde. Pedimos desculpas pelo ocorrido. Vamos resolver a situação o mais rápido possível. Por favor, entre em contato conosco pelo WhatsApp 11 96059-8900 ou e-mail [email protected]

  4. Antônio Alves Pedrosa Neto
    Antônio Alves Pedrosa Neto

    Muito interessante, excelente matéria.

  5. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Excelente matéria.

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