A morte de George Floyd em 2020 impulsionou o movimento Black Lives Matter e provocou uma onda global de protestos contra o racismo e a violência policial | Foto: Shutterstock
Edição 271

Quando o Black Lives Matter colonizou o mundo

Cinco anos atrás, as elites ocidentais se renderam a uma ideologia racial reacionária

Cinco anos atrás, em 25 de maio de 2020, George Floyd foi assassinado por um policial branco que pressionou seu pescoço com o joelho. Esse assassinato e o grito abafado de “não consigo respirar” foram capturados em vídeo e compartilhados pelo mundo todo. O movimento Black Lives Matter (“Vidas Negras Importam”), que teve início com o assassinato do adolescente negro Trayvon Martin, em 2012, foi superalimentado, gerando meses de manifestações e protestos nos Estados Unidos e em todo o mundo.

O BLM tinha pretensões de radicalização. Os ativistas acreditavam que estavam se insurgindo não contra um assassinato policial brutal e chocante, mas contra “o sistema” em si. Um sistema que consideravam inerentemente racista, corrompido pela “branquitude” e para sempre manchado pelos pecados originais da escravidão e do colonialismo. Por que, então, esse movimento foi abraçado, quase imediatamente, por praticamente todas as instituições estabelecidas existentes? Dos grandes bancos aos oligarcas da tecnologia, dos políticos aos filantropos, da Universidade de Oxford à família real britânica, todas as elites ocidentais se ajoelharam diante da força do BLM.

Apesar de sua retórica antissistema, o movimento Black Lives Matter foi rapidamente adotado pelas elites ocidentais, incluindo bancos, big techs, universidades e até a realeza britânica | Foto: Shutterstock

Em muitos casos, o ato de se ajoelhar foi literal. Os democratas de alto escalão, liderados por Nancy Pelosi, reuniram-se no Capitólio envoltos em estolas de tecido kente para se ajoelhar por oito minutos e 46 segundos, o mesmo intervalo de tempo que durou a pressão do joelho do policial sobre o pescoço de Floyd. Keir Starmer, primeiro-ministro do Reino Unido, também posou para uma foto ajoelhado. Os jogadores de futebol da Premier League de repente começaram a se ajoelhar antes de cada partida.

Embora não tenha sido surpresa ver estudantes universitários saírem às ruas em nome do BLM, ninguém imaginava na época a que ponto os líderes estudantis, mesmo nas nossas instituições mais antigas, iam aderir ao movimento BLM. O então vice-reitor da Universidade de Oxford escreveu uma carta aberta aos alunos afirmando que a universidade de língua inglesa mais antiga do mundo agora “[se identificava] totalmente com a visão do Black Lives Matter”. Currículos de escolas e universidades foram redesenhados, a história foi reescrita, e até mesmo as disciplinas de ciências exatas foram “descolonizadas” à força. Os especialistas, acadêmicos e cientistas que tinham insistido fortemente nos lockdowns durante a pandemia de covid-19, ainda em curso, de repente aram a insistir que os prejuízos do “racismo sistêmico” à saúde iam “muito além dos danos causados pelo vírus” e que as aglomerações eram agora essenciais para a saúde pública.

As empresas estavam especialmente interessadas em anunciar sua fidelidade. A Bolsa de Valores de Nova York fez oito minutos de silêncio por Floyd. Todas as grandes marcas participaram da campanha da hashtag #BlackOutTuesday, em 2 de junho de 2020, pouco mais de uma semana depois do assassinato. O McDonald’s mudou seu nome em todos os canais de mídia social para “Amplifying Black Voices”. O sorvete Ben & Jerry’s — que pertence à Unilever, uma das maiores produtoras de bens de consumo do mundo — fez uma promessa solene de “desmantelar a supremacia branca”. A Apple — a empresa de tecnologia mais rica do mundo — substituiu todas as estações de rádio em seu aplicativo de música por um único streaming tocando Fuck Tha Police, do NWA, sem parar. A Lego, a maior empresa de brinquedos do mundo, retirou a publicidade de seus brinquedos relacionados à polícia.

A Apple substituiu todas as estações de rádio do seu app musical por uma transmissão contínua da música Fuck Tha Police, da NWA, como gesto de apoio ao BLM, em 2020 | Foto: Divulgação/NWA

Talvez a imagem definidora da adesão corporativa ao BLM tenha sido Jamie Dimon, o bilionário CEO do JPMorgan Chase, ajoelhando-se com um cofre de banco aberto de fundo. De propósito ou não, isso sinalizou que havia muito dinheiro a ser faturado com o momento Black Lives Matter. Profeticamente, o mercado de ações deu um salto de 3,4% logo depois da morte de Floyd. Naquela época, antes do boicote anti-woke à Bud Light e da “mudança de vibração” que coincidiu com a reeleição de Trump, as empresas viam algum tipo de “posicionamento” como uma forma sem custo de melhorar a reputação de suas marcas e promover seus produtos. A Nike foi o modelo nesse caso. Quando lançou, em 2018, uma campanha publicitária com o jogador da NFL Colin Kaepernick — que havia sido expulso por se ajoelhar durante o hino nacional dos EUA —, suas vendas aumentaram em bilhões.

No entanto, seria um erro sugerir que a reação das grandes empresas ao BLM foi apenas uma “limpeza de consciência” em nível superficial. A diversidade, a equidade e a inclusão (DEI), que já eram um setor de US$ 8 bilhões nos EUA antes dos protestos do BLM, tornaram-se muito mais difundidas e firmemente institucionalizadas nos setores público e corporativo. As iniciativas de DEI pareciam dar às elites empresariais uma sensação de propósito que antes lhes faltava. Os executivos da Peloton, por exemplo, não eram mais meros vendedores de equipamentos de ginástica superfaturados. De repente, podiam se apresentar como guerreiros “lutando contra a injustiça racial”, “promovendo mudanças significativas” e “fazendo o trabalho antirracista”. Ocorre que, no fim das contas, aqueles manifestantes do BLM que incendiaram delegacias de polícia não eram revolucionários radicais, pareciam mais a ala militante do departamento de RH.

As políticas de diversidade, equidade e inclusão se tornaram uma nova bandeira de propósito para elites empresariais após os protestos do BLM, transformando executivos em supostos guerreiros antirracismo | Foto: Reprodução/X/Christine Vo

A política racial defendida pelo BLM também só poderia beneficiar as elites. As Coca-Colas e Nikes do mundo estão muito interessadas em destacar as diferenças raciais entre os trabalhadores sempre que podem. Colocar os “privilegiados” contra os “oprimidos” acaba diminuindo os interesses comuns das pessoas enquanto trabalhadores. Um gerente que assume a missão de combater o racismo no local de trabalho vai descobrir que, de repente, tem muito mais autoridade para monitorar os relacionamentos interpessoais dos trabalhadores e até mesmo suas vidas privadas e atividades políticas, especialmente nas mídias sociais. As elites sempre se valeram da raça para dividir e controlar as pessoas. Mas, se antes usavam clichês racistas, o BLM lhes deu licença para usar o “antirracismo” para os mesmos fins.

Outro fator que impulsionou a disseminação do BLM foi a pressão para se adequar. As pouquíssimas instituições e empresas que não aderiram ao movimento foram denunciadas em alto e bom som, e cabeças foram cortadas. Questionar qualquer aspecto do movimento estava simplesmente fora de questão. Qualquer pessoa que chamasse a atenção para as falhas na narrativa do “racismo sistêmico” ou até mesmo se opusesse aos protestos que estavam sendo realizados em nome do BLM — os mais caros e destrutivos da história dos EUA — poderia ser impiedosamente cancelada.

A grande mídia foi especialmente relutante em reconhecer os tumultos. Em uma reportagem da CNN que ficou famosa, um âncora de telejornal estava em frente a um prédio em chamas em Kenosha, Wisconsin, descrevendo as cenas como “inflamadas, mas principalmente pacíficas”. O Facebook e o Twitter censuraram postagens desfavoráveis a ativistas proeminentes do BLM. O Google colocou avisos de conteúdo em artigos — inclusive um de Tom Slater, da Spiked — que desafiavam a narrativa do Black Lives Matter.

É revelador que uma notícia que foi muito censurada nas mídias sociais tratava da compra de várias mansões por Patrisse Khan-Cullors, que criou a hashtag #BlackLivesMatter e cofundou a Black Lives Matter Global Network Foundation (BLMGNF), um dos principais beneficiários das doações relacionadas ao BLM. Em dezembro de 2020, a revista The Economist informou que colossais US$ 10,6 bilhões haviam sido prometidos a causas e organizações afiliadas ao BLM. No entanto, parece ter havido muito pouco interesse ou supervisão sobre como esse dinheiro foi gasto. Além dos milhões investidos em imóveis de alto padrão (a BLMGNF afirma que isso era necessário para a produção de “conteúdo”), uma quantidade impressionante de doações do Black Lives Matter de alguma forma foi parar em grupos de defesa dos direitos trans. Em determinado momento, o Google, a Apple e a Microsoft quase doaram milhões para uma entidade chamada — para confundir — Black Lives Matter Foundation, que não tinha nada a ver com a organização “oficial” de Khan-Cullors, tamanha a ânsia de evidenciar que estavam fazendo algo pelo BLM.

A cofundadora do BLM, Patrisse Khan-Cullors, foi alvo de críticas após a compra de mansões com recursos doados | Foto: Wikimedia Commons

Dificilmente haveria um indício mais claro de que os principais apoiadores do BLM nunca estiveram mobilizados por uma causa propriamente dita, nem interessados em mudanças radicais em qualquer “sistema”. Alguns foram arrastados pela histeria coletiva, outros queriam aproveitar a onda em busca de atenção e lucro, outros, ainda, pretendiam estabelecer novas linhas divisórias raciais, enquanto um quarto grupo, sem dúvida, estava aterrorizado com as consequências de não se juntar ao rebanho.

Cinco anos depois do trágico assassinato de George Floyd, todos podemos ver o BLM como a cruzada reacionária e elitista que sempre foi.


Fraser Myers é editor-adjunto da Spiked e apresentador do podcast da Spiked. Ele está no X: @FraserMyers.

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