O que será necessário para acabar com a mentira da “criança transgênero”? A instituição beneficente para crianças Mermaids, disseminadora de tantos mitos sobre a questão trans, há muito tempo caiu em desgraça. A imperícia da clínica de identidade de gênero Tavistock, do Sistema Nacional de Saúde (NHS, na sigla em inglês) britânico, foi exposta, e o centro foi fechado. O Relatório Cass revelou que os bloqueadores de puberdade representam “riscos muito consideráveis” para as crianças, o que levou a uma proibição indefinida. E ainda houve a recente decisão da Suprema Corte do Reino Unido de que homens não são mulheres. No entanto, por incrível que pareça, apesar de todos esses acontecimentos, algumas semanas atrás foi descoberto que bebês e crianças de colo que acreditam que são transgênero ainda estão recebendo tratamento de gênero no NHS.
Depois que o Relatório Cass foi publicado, em abril do ano ado, o NHS Inglaterra elaborou um guia com orientações impedindo que crianças com menos de sete anos de idade fossem encaminhadas para clínicas especializadas em gênero. Mas parece que a medida sensata foi derrubada depois que ativistas trans responderam a uma consulta sobre essa orientação. O NHS agora diz que a abolição dos limites de idade está de acordo com a recomendação do Relatório Cass de oferecer apoio e orientação às famílias de crianças transgênero. De acordo com dados vistos pelo Telegraph, até dez crianças em idade pré-escolar estão sendo tratadas neste momento, e 157 crianças com 9 anos ou menos foram encaminhadas aos serviços de gênero.

Os números são pequenos, e os defensores do NHS vão argumentar que é bom que as famílias estejam recebendo ajuda e aconselhamento. Mas nenhuma criança nasce no corpo errado. Nem um único bebê menino é, na verdade, uma menina. E, como não existem crianças transgênero, não deveria haver necessidade de encaminhamento médico. Alguns pais podem precisar de garantias de que é perfeitamente normal as meninas brincarem com caminhões e os meninos dançarem com fantasias de princesa. Mas, como o projeto de orientação do NHS reconhece, isso “não costuma ser indicativo de incongruência de gênero”. Uma conversa de cinco minutos pode ser apropriada, talvez, mas não uma sessão prolongada de aconselhamento.
Além disso, nenhuma criança chega sozinha à conclusão de que é transgênero. Os bebês não carecem apenas de vocabulário, mas também não fazem ideia de que as pessoas possam ter uma noção mística de “identidade de gênero”. As crianças pensam na possibilidade de serem trans somente quando professores, pais ou ativistas on-line espalham essas ideias ridículas.
É por isso que precisamos nos preocupar com o fato de o NHS oferecer sessões de aconselhamento de gênero a elas. Uma criança incentivada a pensar que está no corpo errado provavelmente terá suas ilusões confirmadas ao ser levada a examinar sua “identidade de gênero” e ser tratada de forma diferente das outras crianças.
Até mesmo o fato de um pequeno número de crianças pequenas estar recebendo “tratamento” para “disforia de gênero” revela a influência contínua e perniciosa dos ativistas trans no NHS e o enraizamento da ideologia de gênero dentro da organização. A prova dessa captura institucional é fornecida pelos membros da Associação Médica Britânica, muitos deles tendo classificado a decisão da Suprema Corte sobre sexo como “biologicamente absurda” e “cientificamente analfabeta”.

O retrocesso do tratamento para “crianças trans” após o Relatório Cass foi, na verdade, uma cortina de fumaça. A clínica Tavistock fechou, mas em seu lugar surgiram novos centros regionais que ofereciam serviços de gênero para crianças. Apenas três meses depois que os bloqueadores de puberdade foram proibidos “indefinidamente” em todo o Reino Unido, no ano ado, foi anunciado um ensaio clínico de 10,7 milhões de libras que disponibilizou os medicamentos para crianças como parte de um “experimento”.
Crianças não são cobaias, e mudar de gênero não é como comprar uma roupa nova para elas. Encaminhar as crianças na direção da identidade trans — seja por meio de transição social (mudança de nome, pronomes e roupas para o sexo oposto), aconselhamento, seja por meio do uso de medicação — tem consequências graves. Isso pode significar cirurgias, infertilidade e necessidade de reposição hormonal pela vida toda. Infelizmente, as clínicas de gênero do NHS parecem ser o último lugar onde as crianças serão advertidas contra esses perigos.
Precisamos ir além e mudar não apenas a lei, mas também as práticas culturais que apresentam às crianças a ideia de que elas podem ser transgênero. Crianças pequenas não precisam de aconselhamento sobre gênero — elas só precisam ouvir “não”, elas não nasceram no corpo errado.
Mas sejamos honestos. Não são as crianças que estão se encaminhando sozinhas para o NHS — são os pais. Não deveríamos nos surpreender. Afinal, as mães e os pais ouvem que as crianças nascem sem sexo e reconhecem sua “identidade de gênero” assim que respiram pela primeira vez. Disseram a eles que não há mal nenhum em “afirmar” a identidade de uma criança. Pais e mães foram levados até a sentir culpa pelo fato de uma criança trans correr risco de suicídio e foram informados de que é melhor ter uma filha viva do que um filho morto. Portanto, não é de se irar que alguns agora acreditem erroneamente que apoiar filhos confusos significa procurar aconselhamento de gênero e até mesmo incentivá-los a fazer a transição. Claramente, também existem alguns adultos que estão empenhados em usar as crianças como bandeiras ambulantes do orgulho progressista.

Para acabar com a mentira das crianças trans, o NHS precisa parar de ceder aos ideólogos de gênero e dizer não aos pais “progressistas”. Ao mesmo tempo, as mães e os pais precisam dizer aos filhos que eles não nasceram no corpo errado e que são perfeitos como são.
Joanna Williams é colunista da Spiked e autora de How Woke Won. Ela é pesquisadora visitante do Mathias Corvinus Collegium (MCC), de Budapeste.
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